"Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles.Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles.Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração.Como eles admiravam estarem juntos!Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos."Clarice Lispector
E mais uma vez um desencontro de idéias...
Ela, mais uma vez desistiu.... Ele, mais uma vez não se deu uma chance...
E passaram-se os dias... A cada toque do telefone, um calafrio percorria o corpo dela. Não era ele... Não seria...
A mágoa tomou de conta do seu coração... Consumindo a ultima gota da sanidade que ela preservara.
E a vida seguiu. Ela viveu como antes, as mesmas festas, as mesmas pessoas e até as mesmas bebidas tornaram-se parte do seu processo de ocupação mental, um modo de fingir para si própria que tudo estava indo bem.
Ele se ocupou, também soube aproveitar cada minuto sem a necessidade daquela voz que o fazia, por vezes, esquecer os problemas e dar risada da vida...
Eles lembraram, sim, dos dias em que sorriam, brincavam e conversavam, mais a decisão estava tomada... ninguém queria voltar atrás...
E teve o dia da raiva, o dia da falta, o dia da superação e o dia de não mais suportar aquela ausência... O dia de quebrar o orgulho: Ela ligou.
Num momento de carência, fraqueza, saudades... Ela desejou ouvir de novo a voz...
Aquela que ja fazia parte da sua rotina, que a fazia rangir os dentes de raiva ou gargalhar de alegria...
E a voz foi receptiva... Ele também quis vê-la.
E tudo recomeçou, ele quis vê-la, sentí-la, tocá-la. Ela, que jamais escondera que muito a agradava aquela companhia, aceitou-o de volta.
Mais dessa vez estava tudo tão diferente... Ela sabe que isto não durará para sempre... Quando esta fase irá passar?
O medo de sofrer é o seu maio pesadelo. Ela não quer se apegar. E se ele for embora novamente? Não... Dessa vez será tudo de outro modo. Outras atitudes, outros sentimentos.
Muitas perguntas rondam sua cabeça... Porque ele voltou? Será que também sentiu falta? O que ele realmente quer?
As respostas pras demais ela não tem.
Mais a resposta da ultima pergunta sim: Ele não quer você.
Simples assim...
Ilusão? Não.
Necessidade de estar junto talvez...
O fato é que a bela moça está presa a uma linha invisível de um sentimento descontínuo, do qual ela mesma não sabe explicar...
E ele, que tenta afastar uma presença que torna-se, a cada dia, mais necessária a sua vida. Não de uma necessidade contínua, mais uma dependência física, psicológica.
Ambos apesar de não admitirem, necessitam um do outro ainda que apenas uma tênue presença, seja ela real ou imaginária...
E o amor? Não existe... Tudo isso está muito além da hipocrisia do que se chama 'amor'. É um sentimento alado, um dia ele vem: forte, intenso... No outro se esvai feito água nas mãos...
Talvez seja mais, talvez seja menos... Talvez nem exista!
A palavra certa pra definir?
P-A-R-C-E-R-I-A.
/criis